quinta-feira, 15 de março de 2012

Panelinhas de moranga

Comida de infância, comida de mãe, agora, passou a ser comida pra mãe no cardápio de todo dia na minha cozinha. Se a velhice dá uma marcha à ré no tempo e traz a criança de volta, e se contra isso quase nada pode-se fazer, então o caminho é procurar aceitar e fazer essa menina contente usando as ferramentas que se tem à mão. As panelas sempre foram motivo de alegria para minha mãe, tanto no preparar como no comer, e também nisso somos parecidas. Na rotina doméstica, no sem-fim de tantas e tantas tarefas, escolho sempre, sem pensar nem uma vez, cozinhar. Mesmo que destreinada dessa lida diária, voltei a gostar da "agenda culinária": pensar no almoço do dia seguinte antes de dormir, colocar feijão de molho na véspera, passeios à fruteira, ao supermercado, à padaria, ao açougue... Melhor ainda é que nas últimas semanas minha mentora gastronômica tem me acompanhado em algumas dessas compras, saudosa que andava das idas ao mercado, seu programa preferido. Comove-me vê-la entusiasmada como criança por balas com as batatas rosas novas, imaginando um belo purê, com o cheiro do abacaxi, o perfume das uvas, dos pães, com a variedade de feijões, sua maior paixão que não pode faltar mais do que um dia... E nessa roda-viva de café da manhã, almoço, café da tarde, janta (e eventuais lanchinhos nos intervalos), muitos sabores esquecidos vão sendo resgatados. Assim como sua memória, afiada ao passado, volta e meia lembro de algum prato lá de trás, da mesa da sua cozinha, que há décadas não experimento. Semana passada, foi a vez das moranguinhas recheadas. Seus olhos faiscaram ao deparar-se com um cesto das morangas em miniatura no supermercado, e pensamos em dueto: Vamos fazê-las recheadas?! É claro que vamos!! Querem ver um dos pratos que mais me impressionavam quando quem cozinhava era minha mãe, e eu só sabia admirar suas habilidades?
Para começar a dar cara de panelinha à pequena moranga, recorta-se a tampa.
Retira-se.

Com uma colher de sobremesa, raspa-se o miolo pra retirar as sementes.
Recheia-se com carne moída refogada com temperos e ovos duros picadinhos.

Fecha-se a panelinha e enrola-se em papel alumínio para ir ao forno em temperatura média por mais ou menos 4o minutos.

Abre-se o pacote com cuidado e, depois de fazer o teste do garfo, se estiver macia é chegada a hora de visitar o passado de garfada em garfada.

O almoço que contou um pouco da nossa história, além do gosto bom da comida simples, foi também terapêutico. Voltar à mesa comandada pela mãe, mesmo que pela luz já enfraquecida das minhas recordações, fez tanto bem a mim e a ela. Ainda hoje, ser lembrada como uma boa cozinheira é um carinho extra ao seu feminino provedor. Por tabela, uma terna alegria à maestra das minhas panelas que aprendi a ser com ela.
Que continuemos firmes nos nossos pontos fortes, aqueles que nos ancoram e, graças aos céus, nos divertem. Amém.

segunda-feira, 12 de março de 2012

Pufe recauchutado (outra vez)

Depois da festa da afiação de unhas que Bibi, nosso eterno bebê felino, fez no pufe da sala, como mostrei aqui, ele ganhou capa de uma lonita que me traz lembranças boas dos colchões antigos, recheados de palha, encontrados em casas do interior. O malandrinho até que perdeu o hábito, mas volta e meia, tem recaída e deixa suas marcas. Mas, vamos ser justos: os outros "meninos" da casa também têm participação nos estragos do segundo forro, acostumados a descansar os pés calçados ignorando minha cara torcida. E o pufe customizado voltou a ficar feinho. Tão sujinho, que nem uma boa lavada resolveu, sem falar que o pano encolheu e ficou parecendo calça curta de criança que cresce de uma hora para outra. Resolvi então juntar o útil ao agradável, reaproveitando a capa que já estava pronta com a estampa que gosto tanto. Fiz uma barra com reaproveitamento de retalhos de calças jeans e estava resolvido o problema do comprimento.

No paraíso do meu inverno fake, só olhando pela janela os dias incandescentes lá fora nesse março de calor histórico, crochetei "no olho" uma sobrecapa, apenas obedecendo a harmonia de cores com as do listrado.

Apesar da base quadrada, trabalhei em voltas circulares, apaixonada que sou pelos redondos, e deixei para resolver a equação círculo-quadrado no final. A elasticidade da lã e dos pontos altos me salvou. Foi só dar uma puxadinha aqui e ali enquanto costurava para que o círculo ganhasse cantos e se transformasse num quadrado arredondado. E as bordas onduladas deram um movimento ao cubo tão estático que gostei, parecendo uma toalhinha esticada (ah, os guardanapos de crochê engomados e bem esticados da mãe e tias que me impressionavam deixaram semente, quem diria...) contornada dos sempre graciosos pomponzinhos.
Tão bom dar vida nova ao que nos rodeia. Melhor ainda assim, de pontinho em pontinho que parecem se posicionar para brincar de roda.

Que a gente não esqueça dessas "cantigas" manuais que nos convidam a recauchutar tudo aquilo que gostamos de ter em nossos dias. Amém.